sexta-feira, junho 20, 2008

da experiência de jogo à literacia



Quanto mais lemos mais aprendemos, mais alargamos o nosso conhecimento. Ao lermos um livro descobrimos novas palavras e novos significados. Estamos na presença de novas construções frásicas que enriquecem o nosso raciocínio e alarga não só o nosso potencial interpretativo como também a sua respectiva aplicação prática cada vez mais fluída. Quem lê muito tem maiores probabilidades de escrever melhor, de perceber melhor determinada linguagem. O Homem nunca, em nenhum momento da sua vida, consegue desligar-se da sua cultura. São dependentes um do outro. Ler enriquece a cultura do Homem, assim como ver um filme ou jogar um videojogo. O processo constante de assimilação e acomodação permite-nos alcançar uma maior evolução intelectual. Esta perspectiva vai ao encontro da observação de James Paul Gee: “Nós estamos sempre a aprender alguma coisa” (2004 :22). Nesta comparação entre videojogos e livros podemos constatar com relativa facilidade que jogar um videojogo é difícil. Envolve todo um amplo processo de aprendizagem que pode, por vezes, tornar-se demasiadamente longo. Steven Johnson refere na sua obra que “os jogos são terrivelmente, às vezes loucamente difíceis” (2006: 34). Estes obrigam o jogador a ter que dominar várias áreas físicas e conceptuais ao mesmo tempo e para o mesmo fim. Esta complexidade é, actualmente, um desafio ainda maior na medida em que a generalidade dos videojogos obrigam a saber coordenar múltiplas tarefas para exercícios que podem parecer à primeira vista bastante simples.



Em Call of Duty 2, o principal objectivo é ganhar a guerra. Contudo, esta utópica simplicidade encontra-se subentendida por detrás de inúmeros acontecimentos que o jogador terá que os vivenciar assim como comandos a executar, inimigos a enfrentar e objectivos a cumprir. Pode-se ainda acrescentar o facto de Call of Duty 2 possuir quatro níveis de dificuldade consoante as capacidades de cada jogador. Terminar Call of Duty 2 em oito horas em modo easy não significa que termine em veteran nessas mesmas oito horas. O mais provável é nem sequer conseguir terminar. Quem lê um livro sabe que o termina. Não existe um desafio complementar que coloque sequer a hipótese de não concluir a leitura da obra na última página.

Se definir literacia pode tornar-se complicado quando se analisa questões ligadas ao texto ou à imagem estática, mais complicado se torna se analisarmos os videojogos e todos os seus significantes. Desde o texto, à imagem estática, passando pela imagem dinâmica, som, música, interface, interactividade ou jogabilidade, os videojogos desafiam todos os jogadores a uma maior capacidade de absorção, assimilação, interpretação, interiorização e acomodação dos seus significados. Definir literacia nos videojogos pode ser tão difícil como jogá-los. Encontra-se sempre dependente do Homem, da sua cultura e das suas experiências individuais. Da mesma forma que quem lê muito tem maior probabilidade de escrever melhor, quem joga muito tem maior probabilidade de conseguir interpretar simultaneamente diversos significados imbuídos numa multiplicidade de áreas artísticas e culturais.

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Referências bibliográficas:
GEE, James Paul (2004), What Videogames Have To Teach Us About Learning And Literacy, New York, Palgrave Macmillan.
JOHNSON, Steven (2006), Tudo o Que é Mau Faz Bem, Porto, Edições ASA.