domingo, fevereiro 17, 2008

"habitantes" de mundos interactivos

Uma das grandes potencialidades dos videojogos, encontra-se intrinsecamente interligada com a possibilidade de criação do todo a partir do nada. A não-necessidade de referentes da realidade para a produção de qualquer tipo de mundo interactivo permitiu alargar a imaginação criativa a uma infinidade de alternativas.
Com a passagem dos gráficos 2D para os gráficos 3D (em meados da década de 90), os videojogos começaram a apresentar-nos cenários visualmente mais detalhados, complexos e com uma profundidade espacial verdadeiramente notável. Num discurso essencialmente metafórico, Dave Morris e Leo Hartas fazem referência à enorme dimensão presente no processo de concepção, modelação e animação de cenários virtuais criados a partir do nada. “Nos media antigos quando os artistas precisam de criar mundos, eles apenas criam o topo do iceberg. Actualmente, os artistas e criativos dos videojogos têm uma tarefa bem mais arrojada. Eles precisam de criar todo o iceberg” (2004: 8).



Seguindo este ponto de análise, podemos partir do exemplo de Grand Theft Auto III. Este foi dos primeiros títulos a apresentar uma representação virtual de uma cidade repleta de referentes do quotidiano, tendo conseguido oferecer “uma completa e bonita cidade 3D com ciclos diários e nocturnos, diversos distritos e um elenco de personagens considerável – pela primeira vez, o sonho de jogar num mundo virtual estava perto de se concretizar” (BYRON, CURRAN e MCCARTHY, 2006: 85). Os jogadores, através de uma infinidade de possibilidades, conseguiam, de facto, “jogar no ambiente interactivo de Grand Theft Auto III permitindo-lhes explorar o mundo virtual de forma crescente, sofisticada e imersiva” (THOMPSON, GREEN e CUSWORTH, 2007: 64).
Tim Shymkus da High Voltage Software refere na obra de Dave Morris e Leo Hartas, que “os jogos permitem aos jogadores serem transportados para mundos que apenas poderiam ser imaginados (...) enquanto que no caso dos filmes existe sempre uma expectativa de realismo que dificulta a criação de mundos diversos e realmente únicos” (2004: 94).



Existem títulos que nos apresentam mundos com cenários futuristas, veículos e inimigos criados a partir da mais pura e flexível imaginação. Em Halo: Combat Evolved o jogador é transportado para o ano de 2552 onde poderá interagir num amplo cenário pertencente a um planeta fictício e vivenciar, uma experiência simulada de algo que não existe. Também o videojogo Prey, apresenta-nos cenários amplos e futuristas do interior de uma enorme nave espacial alienígena. Todos os requintes ficcionais, luzes e leis da física alteradas, permitem ao jogador ver e experimentar algo que até à altura desconhecia.





Experimentar armas resultantes de metamorfoses de tecido vivo, metal e lasers, passando por tapetes que invertem o cenário e a própria lei da gravidade, Prey resulta numa viagem pelo desconhecido, através de uma perspectiva diferente de um futuro que alarga os nossos processos constantes de tentativa-erro, proporcionando desta forma uma interiorização de novos conhecimentos, novas realidades e novas regras que quebram ao máximo os limites racionais das funcionalidades do nosso mundo. Contudo, e apesar destas potencialidades, a “imitação da realidade” (KELMAN, 2005: 282) ainda continua a ser uma meta muito desejada, levando grande percentagem de criadores a sujeitarem as suas criações à presença obrigatória de referentes, numa tentativa, por vezes forçada, de aproximar a ficção do real e/ou a simulação da realidade.
Seja qual for a escolha dos criadores, é preciso ter em conta que “ao criar um cenário vivo e consistente, consegue-se transportar o jogador para dentro de uma espécie de sonho acordado que reside no coração de toda a ficção” (BATES, 2004: 99).

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Referências bibliográficas
BATES, Bob (2004), Game Design - Second Edition, Boston, Thomson Course Technology.
BYRON, Simon, CURRAN, Ste e MCCARTHY, David (2006), Game On! From Pong To Oblivion - The 50 Greatest Video Games of All Time, London, Headline Publishing Group.
KELMAN, Nic (2005), Video Game Art, New York, Assouline Publishing.
MORRIS, Dave e HARTAS, Leo (2004), The Art of Game Worlds, Cambridge, ILEX.
THOMPSON, Jim, BERBANK-GREEN, Barnaby e CUSWORTH, Nic (2007), The Computer Game Design Course - Principles, Practices and Techniques For The Aspiring Game Designer, London, Thames & Hudson Ltd.

domingo, fevereiro 03, 2008